Elementos dos Círculos de Construção de Paz | Parte 2

O Objeto da palavra ou bastão de fala

Segundo aprendemos como a Kay Pranis o objeto da palavra é um elemento essencial dos Círculos de Construção de Paz.

Mas o que é o objeto da palavra?

É qualquer objeto que tenha significado para o grupo ou tenha relação com o tema que será tratado no Círculo. Pode ser uma pedra, um bastão, um bichinho de pelúcia, uma caneta entre tantos outros.

É um elemento essencial para os Círculos de Construção de Paz porque democratiza e aprofunda os diálogos dando voz e vez a todos. Nos Círculos, só pode falar quem está com o objeto da palavra na mão e quem não está, tem o poder de escutar com o coração.

E qual a sua origem?

Churinga | Museu do Amanhã RJ

A origem dos objetos da palavra ou bastão de fala remete a aldeias indígenas da América do Norte, mas observamos que várias culturas ancestrais também se utilizavam deste recurso em conselhos, contação de histórias, tomadas de decisão, cerimônias coletivas e até mesmo para ensinar os mais jovens.

É o caso do “Churinga” que está exposto no Museu do Amanhã no Rio de Janeiro. Esse artefato dos aborígines australianos de aparência enigmática, é, na verdade, uma ferramenta. Contudo, não serve para furar ou cortar: trata-se de um utensílio simbólico que serve para os anciãos contarem aos mais jovens as histórias, os mitos e as lendas que compões o coração de sua cultura.

Um convite para falar com o coração…

O objeto da palavra representa o poder da fala e o respeito por todas as pessoas. Assegura a quem está falando a liberdade de falar sem represálias ou humilhação, legitimando seu ponto de vista. Ele traz implicitamente a coragem, a força e a sabedoria para falar com o coração, para cada um trazer a sua verdade.

Quando uma conversa é orientada por um objeto da palavra as pessoas tendem a falar com mais intenção e além disso, todos que ouvem são instigados a escutar atentamente. O objeto da palavra traz segurança para o diálogo ao evitar interrupções e ampliar os silêncios. Desta forma as pessoas se sentem mais à vontade para trazer as suas vulnerabilidades, gerando mais empatia e conexão. Mostrar-se vulnerável e expor fragilidades causa uma resposta imediata em quem escuta, abrindo os corações de todos.

Por que o objeto da palavra é indispensável nos Círculos?

  1. Porque ele distribui o poder;
  2. Convida os participantes a escutar mais do que falar;
  3. Permite a livre manifestação de todos, incluindo os mais tímidos;
  4. Materializa a igualdade no Círculo, todas as vozes tem o mesmo valor;
  5. Traz mais presença;
  6. Controla a ansiedade de falar sem refletir;
  7. Reduz o controle do facilitador.

A medida que o objeto da palavra passa de mão em mão, tece um fio de conexão entre os participantes do Círculo. Permite a expressão completa das emoções, reflexão atenciosa e traz para a conversa um outro ritmo, encorajando os participantes a desacelerarem e a estarem presentes com eles mesmos e com os outros.

(Texto de Carla Grahl inspirado nas lições de Kay Pranis)

Elementos dos Círculos de Construção de Paz | Parte 1

A peça de Centro

Em tempos pós-pandêmicos, de encontros virtuais, temos relativizado a importância da peça de centro nos Círculos de Construção de Paz, mas ela não deixou de ser importante e penso que, nos Círculos presenciais, é uma peça indispensável.

Sabem por quê?

Usamos a peça de centro para criar um ponto de referência que dá o suporte para falar a partir do coração e a escutar com o coração. A peça de centro é normalmente colocada no centro do espaço aberto dentro do círculo de cadeiras. Normalmente, usa-se um tapete. A peça de centro pode incluir itens que representem os valores do eu verdadeiro, os princípios fundamentais do processo ou uma visão compartilhada do grupo.

As peças de centro seguidamente enfatizam a inclusão ao incorporar símbolos individuais dos participantes, assim como símbolos das culturas representadas no Círculo. O que quer que seja incluído no centro deve promover a sensação de acolhimento, hospitalidade e inclusão.

A peça de centro deve também reforçar os valores que fortalecem o processo. Os facilitadores devem estar muito atentos ao escolher objetos para colocar no centro, a fim de que não escolham algo que possa alienar um membro do Círculo. É muito importante que o facilitador explique o significado de qualquer objeto que tenha colocado no centro.

A peça de centro, além de materializar os valores e as diretrizes que são depositadas, também materializa o princípio da igualdade. Todos os participantes estão a mesma distância do centro. Num Círculos todos somos iguais!

Serve também como uma fonte de apoio à presença qualificada que se almeja. Quando o pensamento, por alguma razão, se afasta do Círculo, a gente olha para o centro e lembra imediatamente de onde estamos, com quem estamos e o que estamos fazendo, trazendo a presença de volta.

Por fim, o centro serve como ponto de fuga. Quando estamos vivenciando no Círculo alguma situação de constrangimento, vergonha ou outra emoção desconcertante e não queremos cruzar nosso olhar com o olhar dos demais participantes, baixamos os olhos para o centro, nos conectamos com o nosso melhor e nos fortalecemos para seguir em frente.

Com o passar do tempo, as peças de centro podem ser construídas coletivamente com cada vez mais representações do grupo e dos indivíduos no Círculo. Por exemplo, um Círculo pode começar com um tapete e um vaso de flores. Pode-se pedir aos participantes, antes da realização do Círculo, que tragam um objeto que represente um aspecto importante de suas vidas. Pode-se pedir aos participantes que se apresentem, que compartilhem o objeto que trouxeram dizendo o que significa para eles e, em seguida depositá-lo no centro. Na rodada subsequente, durante a discussão dos valores, os participantes podem escrever um valor em um papel e podem colocá-lo no centro. O centro agora terá o tapete original, as flores, os valores e todos os objetos trazidos pelos participantes. Uma peça de centro que inclua algo de cada participante é um símbolo poderoso, tanto de conexão e pontos comuns, como da riqueza da diversidade.

Os objetos do centro simbolizam o grupo, o processo restaurativo e o tema do encontro. Geralmente colocamos flores ou uma planta como símbolo do cuidado com a vida. Outros objetos representam o que o encontro almeja alcançar. Cada espaço é pensado em função dos participantes daquele círculo especificamente. Devemos ficar atentos ao grupo e ao lugar onde estaremos facilitando.

(Texto de Carla Grahl inspirado nas lições de Kay Pranis)